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O Parque Nacional da Serra do Cipó, situado na região central de Minas Gerais, é um dos destinos ecoturísticos mais importantes do Brasil, conhecido por sua biodiversidade e paisagens de grande valor cênico. No entanto, a preservação desse patrimônio enfrenta desafios históricos, muitos deles relacionados ao uso do fogo e à indefinição sobre indenizações de terras incluídas nos limites do parque.
Historicamente, o fogo foi utilizado na região tanto para renovação de pastagens quanto para ocupação de terras. Muitos proprietários ainda não receberam indenizações pelas áreas incorporadas ao parque, o que gerou conflitos e práticas de queimadas que ameaçam a conservação ambiental. A ausência de soluções justas e rápidas perpetua o uso do fogo para atividades como pecuária e agricultura, especialmente em períodos de seca, aumentando o risco de incêndios descontrolados.
"Fogo Zero" dominou, buscando a supressão total do fogo. Embora essa estratégia tenha reduzido as áreas queimadas inicialmente, ela também levou a um perigoso acúmulo de biomassa combustível, transformando a região em um "tinderbox" ecológico.
O ponto de virada veio em 2012, quando um incêndio de grandes proporções mostrou que a política de supressão total era inadequada para um bioma pirofítico como o Cerrado. Em resposta, uma nova filosofia foi adotada: o
Manejo Integrado do Fogo (MIF), formalizado no Plano de Manejo Integrado do Fogo (PMIF) 2023-2026. Essa abordagem reconhece o fogo não como um inimigo a ser erradicado, mas como um processo ecológico que precisa ser gerenciado
O PMIF 2023-2026 é uma estratégia detalhada e participativa que se baseia em queimas prescritas de baixa intensidade durante a estação chuvosa ou no início da estação seca. O objetivo é criar um mosaico de paisagens com diferentes tempos de queima, o que ajuda a reduzir o risco de incêndios grandes e incontroláveis.
Os principais objetivos do plano incluem:
Reverter o cenário de grandes incêndios no final da estação seca.
Proteger áreas florestais sensíveis, como as matas de galeria.
Manter a biodiversidade da região, reconhecendo o papel ecológico do fogo.
O plano também descreve as estratégias setoriais para diferentes áreas da serra e a importância de parcerias com diversas agências e grupos, como o Prevfogo-IBAMA, o Corpo de Bombeiros e as brigadas voluntárias.
Apesar do sucesso inicial, o PMIF enfrenta desafios operacionais e climáticos. Em 2023, a área manejada foi três vezes maior que a área atingida por incêndios, o que demonstrou a eficácia da abordagem proativa. No entanto, a temporada de fogo de 2024 foi um teste crítico. Um incêndio de origem humana, exacerbado por um dos mais fortes episódios de El Niño já registrados, consumiu uma vasta área.
A resposta a esse incêndio foi robusta, com a mobilização de uma grande força-tarefa. Esse evento mostrou que, mesmo com um plano sólido, a Serra do Cipó continua vulnerável a incêndios de grande escala, especialmente em um contexto de mudanças climáticas que intensificam as pressões ambientais. A política de queima prescrita provavelmente ajudou a reduzir a severidade do incêndio de 2024, mas não pôde anular o efeito da combinação de ignição humana com condições climáticas extremas.
Outros desafios incluem a persistência do uso do fogo para manejo de pastagens, um problema cultural e econômico enraizado na região. O PMIF propõe o fortalecimento das parcerias e o desenvolvimento de alternativas socioeconômicas, como o pastejo controlado, para enfrentar esses desafios. A pesquisa científica também é vista como crucial para entender melhor os efeitos do fogo nas espécies endêmicas e para o manejo de espécies invasoras, como a braquiária.
Para garantir a longevidade do ecossistema, o relatório sugere algumas recomendações estratégicas:
Fortalecer e flexibilizar o PMIF, considerando a recorrência de eventos climáticos extremos como o El Niño.
Ampliar e sustentar parcerias, principalmente com as brigadas voluntárias, fornecendo apoio logístico e financeiro contínuo.
Integrar tecnologia e pesquisa, expandindo o uso de sensoriamento remoto e a colaboração com instituições acadêmicas como a UFMG.
Incentivar alternativas socioeconômicas ao uso do fogo, como o pastejo controlado, e agilizar a anuência para queimas controladas em propriedades vizinhas ao parque.
A crescente interdependência entre a gestão local e os fenômenos climáticos globais torna essencial uma abordagem mais adaptável e colaborativa para o futuro da gestão do fogo na Serra do Cipó.